quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Soneto de Aniversário



Passem-se dias, horas, meses, anos
Amadureçam as ilusões da vida
Prossiga ela sempre dividida
Entre compensações e desenganos.

Faça-se a carne mais envilecida
Diminuam os bens, cresçam os danos
Vença o ideal de andar caminhos planos
Melhor que levar tudo de vencida.

Queira-se antes ventura que aventura
À medida que a têmpora embranquece
E fica tenra a fibra que era dura.

E eu te direi: amiga minha, esquece...
Que grande é este amor meu de criatura
Que vê envelhecer e não envelhece.
(Rio, 1942)
Vinícius de Moraes 

domingo, 21 de setembro de 2014

Nobody Home


O tempo - parte IV


-O que procura?
-Mãe!? - disse a garota sorrindo e deixando uma lágrima cair de seus olhos.
-Perdão? - talvez a menina fosse apenas mais uma fugitiva do hospício que tinha ali perto. Abaixei a arma e ela limpou as lágrimas. - Qual é seu nome?
Ela sorriu disfarçadamente enquanto ainda limpava suas lágrimas, jogou o cabelo todo para um lado só e disse:
-Você ainda não sabe, né... Sou Sophie... Uma pessoa que te conhecerá muito bem.
- Sou Leona, Sophie. Queria saber se você tem alguma ligação com o homem que vivia aqui.
- Vivia? O que aconteceu com ele? Digo, acabei de chegar de viagem. - tornou a chorar novamente.
- Você tinha alguma relação com ele, Sophie? - enquanto eu falava com ela, adorava pronunciar seu nome mentalmente, sempre tive ma atração pelo nome "Sophie" e sempre falei que este seria o nome de minha filha.
- Ele é meu pai. - estava com uma mochila e a colocou nas costas de novo. Se ajeitou e me empurrou sutilmente para lado, subiu as escadas sem dizer uma palavras e eu por intuito, a segui. Ela parecia bem astuta e decidida.
Parou em frente a mesa de Thomas e abriu uma gaveta, deixou a mochila no canto da sala e colocou seu dedo em um detector digital dentro da gaveta, acho que era o que Mendez havia mencionado. A estante logo colocou-se para frente e uma porta se abriu.
-Sophie, o que significa isso? Se você sabe de algo que ajude na investigação, você tem que me contar.
Ela fechou a gaveta e pareceu me ignorar. Abriu um pouco a cortina do escritório e olhou pela janela, estava assustada. Tornou a andar até a porta recém aberta e eu a puxei pelo braço.
-Trate de me contar o que está acontecendo agora! Seu suposto pai morre e você não esboça nenhum tipo de reação?! Me diz agora o que você é! Você deve ser a pessoa que mencionaram que não tem digitais!
-Leona, preciso que entre na sala comigo. Aquele homem era seu marido, meu pai e eu não fiquei abalada porque não é a primeira vez que o vejo morrer, mas é a primeira em que eu reencontro você! Foi um homem que o matou... Ok? Por favor, entre na sala e eu lhe explico tudo.
Não pensei duas vezes em entrar, estava furiosa e curiosa por causa daquele maldito caso. Entrei, a sala era revestida de algum tipo de metal e havia uma cadeira nela, ligada a uma grande máquina que eu pensei que poderia fazer um barulho de máquina de lavar ou ser algum tipo de arma. Ela fechou a porta e sentou no chão da sala.
-Continue, Sophie.
-Bom, tudo começou quando eu era bem pequena. Eu tinha subido pra tomar um banho logo depois de jantar e vi você e papai conversando algo sério na mesa. - A menina insistia em me chamar de mãe, mas como eu estava sedenta de respostas, não a interrompi - Você estava assustada e papai cauteloso. Foi quando a campainha tocou e os homens importantes chegaram...

Comfortably Numb


Essa menina astuta está tão "tanto faz" que nem a reconheço mais. Sentada, paralisada, olhando para a parede tentando desligar-se de tudo e de todos. Não se importa muito com os que estão aos arredores e para onde vai, aprendeu que a melhor companhia pra si é ela mesma. Tudo que ela precisa é de seu caderno de poemas, um local pra repousar e escutar sua música e seu destruidor vício escondido. 
Os pensamentos não são felizes, dizem que a menina voltou a sua antiga filosofia de que tudo é passageiro, de que ela não gosta do caos na convivência social e que se cansou novamente da estupidez alheia. Os seus poemas retornaram e as suas histórias estão mais inspiradoras que nunca. Mas o que houve àquela menina? Ah, ela apenas não tem mais as distrações que costumou ter por aqueles minutos de anos, seu vazio retornou e não há ninguém que consiga a tirar daquele isolamento. Ela está confortavelmente entorpecida de memórias mortas. Voltou a ser a poeta que experimentou de tudo para escrever sobre e, aliás, ela sempre soube de onde vem sua inspiração. 
Ei, do que ela tem que reclamar? Ela não está triste, só não está feliz. Já teve dias melhores ilusórios, mas não está nos seus piores. Ela definitivamente não está nos seus piores. Ela está com sua cabeça em dia, organizando sua biblioteca de dores e se afastando de todos. O único sorriso que a alegra verdadeiramente é o de seu pequeno companheiro de vida, um dos que não a abandonaram.
Ouvi dizer que essa menina diz que tem muito a aprender... E que adora ensinar aos outros as lições pelo qual passou, do jeito dela.
Espere, não percebe que parece que ela criou seu próprio mundo, ri sozinha de piadas que ela sabe que só ela vai entender e parece conversar consigo. Ela está sendo observada por uma visão mais nova de si, que achava que em nessa fase que ela se encontra, ela estaria bem diferente. A criança achava que era tristonha e desiludida, mas no fundo tinha esperança. Agora, a esperança se foi, porque teve um tempo em que a menina encarou o mundo sozinha e chorava todas as noites por não ter ninguém que a abraçasse e dissesse "vai ficar tudo bem". Mas, agora, ela não chora mais. Ela encara. E foge de dramas. Pessoas trazem dramas demais e balbuciam sobre coisas que não doem tantos aos já feridos.